quarta-feira, setembro 19, 2007

Chamar a palavra, chamar uma palavra, um vocábulo. E, sobre o
vocábulo, pôr-se em movimento, como quem vai num barco, por
entre correntes e contracorrentes, ao encontro. Ou a pé, num
carreiro, passando pelas pegadas que outros passos, outros
corpos, cavaram, abaularam, altearam...
Navegar à vista, no ar em que as ondas transportam as matérias,
se convertem em formas no olhar, em vozes no espaço, ou em
alguma outra percepção, segundo as velocidades, as
ressonâncias, os traços, as faculdades de um instante. Acabo
por chamar esses movimentos e os memorantes. Para dizer,
querendo tão só dizer esta acção, como o olho antecede a vista,
a orelha antecede o som, a pele antecede o tacto, e... sem
prosseguir outro objectivo que não seja o de aí voltar, aí onde
há isso, as humacidades, e as constelações de matérias e
gestos, movimento e dicções, corpos e traços, revolvendo-se
neles, buscando, encontrando, perdendo, figurando,
desfigurando, fazendo-se, desfazendo, recomeçando. Voltar a
chamar os simples que são esses corpos compostos, de corpos e
almas, de palavras, de partículas e de espaços, tempo e luz,
homem e mulher, nuvens e montanhas, pólen e abelha, morte e
vida. É claro que são palavras, vocábulos, e que ocorrem mal-
entendidos sobre o sentido das palavras, das expressões ou das
intenções. É que vamos elaborando ideias, elaboramo-las sempre,
mais ou menos; e é preciso fazê-lo forçosamente. É um livre
impulso, associar, ligar, juntar, dissociar, desligar, separar.
E isto sem falar em zangas, dos acidentes, dos temperamentos de
passagem que também são formações, agregados de sensações e
desacordos também. E há violências, causas e efeitos... e
cruzam-se e reorganizam-se as respirações e os desejos, os
atrasos e os esgotamentos. Na vida, como se diz, no real,
ouvimo-nos repetir o que sabemos. Sabemo-lo, e ao mesmo tempo,
por vezes, ora entra em colisão, em contraste ou em extensão.
São movimentos. Frequências. No fundo não se sabe a quem cabe,
ou ao que cabe, exprimi-las, nem como. Mas as humanidades são
formas, discursos, consistências dessas forças, dessas
atracções, de muitas expressões. Aqui neste mundo, fotografado
numa folha de papel, interceptar algo como parcelas, fragmentos
soltos dessas forças...aqui, onde há passagem, ou o obstáculo,
ali uma tirada ou um jeito, além o gesto ou a sombra. De
passagem.